DraftOpinião

O draft, as estratégias e a música

Estamos cada vez mais próximos do draft de 2020 da NFL. Este ano, por conta da pandemia do COVID-19, a liga decidiu que o evento de escolhas será virtual. Até mesmo as entrevistas das equipes com os seus pretendentes estão ocorrendo dessa forma.

Embora necessários conforme a mais correta orientação mundial, esse tempo de isolamento social e  homeoffice tem me deixado bastante agoniado e introspectivo, entre outros sentimentos que afloraram. E, junto com a família, trabalho e leituras, os Cowboys e a música têm me ajudado a manter uma razoável sanidade.

Por algum motivo, sempre associei letras de músicas a momentos da vida. Por exemplo, quando penso no que estamos passando, nesse vazio e solidão, com o virtual substituindo completamente o contato humano, a primeira coisa que me vem à cabeça é o baixo do Peter Hook e a letra de Ian Curtis em Transmission do Joy Division (sou um amante do rock sessenta/setentista, do punk e do pós-punk, em especial).

Vocês podem me chamar de louco, mas quando penso no Dallas Cowboys não fujo disso também. Os momentos bons ou ruins da equipe tem trilha sonora, não há dúvida.

Diante do draft que se aproxima, numa dessas noites de insônia, bolei 10 estratégias diferentes que os Cowboys podem adotar. Eu ainda não sei exatamente qual é a melhor ou se alguma delas será adotada, mas todas são possíveis. E agora um recado para todos aqueles que vão longe nessas noites de insônia: cada vez que eu pensava em uma estratégia lembrava de uma música.

Para fins de compreensão do que pensei como estratégias possíveis, faço as seguintes considerações preliminares: na minha opinião, as maiores necessidades dos Cowboys, seja para seu time titular, seja para melhorar a profundidade do elenco, são principalmente para as posições de cornerback, edge rusher, wide receiver, safety, tackle, center linebacker. Dessas, de acordo com o conceito analítico amplamente difundido entre os amantes do futebol americano, são posições premium as de cornerback, edge rusher, wide receiver e tackle, embora em relação a esta última a necessidade de Dallas seja muito mais para o grupo do que a nível de titularidade, podendo ficar em segundo plano.

Ao mesmo tempo, devemos lembrar que o Dallas Cowboys possui as seguintes sete escolhas neste draft:

  • 1ª rodada (17): 17ª geral
  • 2ª rodada (19): 51ª geral
  • 3ª rodada (18): 82ª geral
  • 4ª rodada (17): 123ª geral
  • 5ª rodada (19): 164ª geral
  • 5ª rodada (34): 179ª geral
  • 7ª rodada (17): 231ª geral

Por fim, de acordo com o que pensam os melhores analistas de prospectos oriundos do college,  se fizermos uma big board veremos que a classe de 2020 possui um grupo de 10-15 jogadores muito acima dos demais, com uma sequência de outros atletas muito nivelados até os prospectos 50-60 dessa board. Também, que há posições com um grande número de ótimos atletas, sendo que as classes de wide receivers, interior defensive linemen e offensive tackles são tidas como das melhores de muito tempo, em qualidade e quantidade, ao passo que as franquias terão dificuldade em encontrar ótimos tight ends, safeties e, principalmente, interior offensive linemen fora dos dois primeiros dias.

Partindo disso, me acompanhe nessa viagem sonora entre os possíveis estratagemas a serem adotados pelos Cowboys do draft até o início da temporada (se estiver de headphone, coloque no máximo – caso contrário, respeite os vizinhos que também estão em suas residências – ou não…):

A LÓGICA

Antes de mais nada, procure no seu streaming favorito Logical Song do Supertramp. Feito isso, depois de escutar os primeiros acordes do baixo, aquela entrada do teclado e a aguda voz que rasga a cena toda em seguida, tenha presente que essa estratégia parte da premissa de que Dallas precisa de todas as suas sete escolhas, já que o resultado prático do último draft, até agora, é um desastre em termos de utilização dos calouros na equipe titular. Então, levando em consideração o fim dos contratos, o limite salarial da liga, a necessidade de ingresso de novos talentos, enfim, a forma da roda girar na NFL, a franquia necessita de muitos jogadores nesse draft e, de preferência, ao menos três titulares, além de um ou dois reservas imediatos e/ou para o special teams.

Portanto, a lógica nos informa que os Cowboys devem escolher um nome por rodada, preservando a sua ordem original, elegendo atletas que estejam mais prontos para imediatamente entrar na equipe ao invés de prospectos que necessitem de pelo menos mais um ano de adaptação (esse último aka Marinelli style). As escolhas deveriam ser direcionadas aos famosos MJD/BPA (melhor jogador disponível – best player available) entre as maiores necessidades, preferindo as posições premium nas três primeiras rodadas (edge rusher, cornerback e wide receiver), podendo alguma exceção ser concedida para a hipótese do melhor deles disponível naquele momento ser um safety.

A AVASSALADORA

Várias publicações norte-americanas afirmaram que a família Jones teria interesse em fazer um splash movement nesse draft. Será? No que consistiria esse movimento? Que tal se Dallas subisse na primeira rodada numa ação explosiva e impactante, visando chegar entre as cinco primeiras escolhas? Os alvos possíveis estariam voltados ao edge rusher Chase Young e ao cornerback Jeff Okudah. Mais alguém escuta no fundo as guitarras pesadas de James Hetfield e Kirk Hammett e as palavras Searching, seek and destroy“? Ninguém ficaria triste com qualquer dessas escolhas. A nossa dor de cabeça surgiria ao lembrarmos o quanto nos teria custado para subir da escolha dezessete às cinco primeiras. Provavelmente, se dependêssemos apenas de escolhas do draft para viabilizar a troca, ficaríamos quase sem mais picks em 2020 e possivelmente alguma(s) escolha(s) alta(s) de 2021 estaria(m) comprometida(s).

A chance disso acontecer é muito pequena. Seria, como os jornalistas gostam de chamar, vender toda a fazenda. Se for aquele jogador para ser a cara da franquia por muitos e muitos anos, quem sabe. Mas, sinceramente, essa história de subir muito normalmente cobra um preço muito alto nos anos seguintes, sendo que são raríssimos os casos em que essa tática compensou. Na vitrola, estaria rolando Seek & Destroy do Metallica. Embora excelente música, é muito difícil da banda tocar nesse tom no final de abril de 2020.

 

A OUSADA

E se a franquia que tanto amamos estiver apaixonada por um jogador em especial? E se este prospecto, que todos tinham como já recrutado entre os top-cinco do draft esteja caindo, entre a sexta e a décima escolhas? Então, não seria um preço tão exorbitante quanto a proposta destruidora acima,  ainda que custosa. Na última vez que Dallas fez um movimento desses a franquia subiu da décima quarta para a sexta e lhe custou a escolha original e mais a da segunda rodada (número quarenta e cinco). Nas circunstâncias de 2020, provavelmente para a proposta ser aceita precisaríamos incluir ainda a nossa de quarta ou quinta rodada no pacote. O resultado de 2012 não foi bom. Morris Claiborne nunca jogou o que custou em Dallas ou em time algum, embora tenha sido um bom corner.

Se a equipe sonha muito com um jogador, tem ele como a solução dos seus problemas, é uma alternativa. Talvez o efeito Claiborne mantenha a família Jones com um pé atrás para realizar esse negócio. Todavia, se o Stephen Jones puxar o violão, dedilhar uns acordes, olhar para seu pai Jerry e entoar “Said I’ve been crying, yeah yeah … Oh, my tears they fell like rain … Don’t you hear them, don’t you hear them falling?” do Led Zeppelin certamente esquecerão todos os erros do passado e farão o negócio.

A ARROJADA

Gostam de Blondie? De qualquer sorte, coloquem One Way or Another agora que ela fará sentido. Pode ser que os jogadores considerados como de primeira rodada da big board de Dallas estejam saindo um a um, se esgotando, e, num cálculo especulativo, nenhum daqueles que se pretenda estará disponível na dezessete. E agora, batendo o desespero, o que se faz? One way or another, I’m gonna find ya, certo?

É possível subir um pouco, entre a décima primeira e décima sexta escolhas, visando garantir alguém que a franquia realmente acredite ter o potencial de uma escolha digna da primeira rodada do draft. O preço estaria entre a escolha original e uma de segunda (extorsão) ou terceira (justa) rodadas. É viável, conforme o atleta. Seria para garantir o segundo melhor edge rusher ou cornerback da classe. Vale a pena? Para fazer isso a franquia precisa ter certeza na avaliação do prospecto, já que abrirá mão de um recurso valioso e não pelo melhor jogador da posição daquela classe.

A INSISTENTE

I’ve been holding out so long … I’ve been sleeping all aloneLord, I miss you … nã, nã, nã, nã nã, nã, nã … nã nã, nã, nã, nã, nã nã, … nã, nã, nã nã. Está certo, ele nunca jogou pelos Cowboys, mas parafraseando algum gênio é a saudade do que a gente não viveu. Foi alguém dos Rolling Stones que disse isso, né? Acho que foi o Mick Jagger enquanto compunha Miss You do seu excelente álbum Some Girls de 1978.

O lance é oferecer a nossa escolha de número dezessete da primeira rodada em troca do Jamal Adams. Seguindo a mesma toada, se ao alcançarmos a posição dezessete e nenhum daqueles que se avaliou como nota de primeira rodada estiver disponível, quem sabe uma ligação para Nova York, a fim de conversar com os dirigentes dos Jets, referente a uma paixão do ano passado e que não foi esquecida pelo front office. Será que, um ano depois, com relativa dificuldade dos Jets em renovar o seu contrato, estando a franquia em completo rearranjo, oferecer uma escolha de primeira rodada não seja suficiente para garantir o jogador? Olha, eu não ficaria nada triste. Só um lembrete: o ideal para ouvir Miss You é em vinil, sim, ele, o bolachão, o elepê, com aquele chiado de início e a reverberação de som que só a nostalgia pode proporcionar. Depois disso é olhar no site dos Cowboys o preço da camisa 33!

A MALUCA

Essa hipótese é muito parecida com a anterior. Muito. A diferença está em que, ao invés dos Cowboys oferecerem a sua escolha de primeira rodada, a franquia realiza esse recrutamento e, quando chegar na quinquagésima primeira escolha a oferece em troca do jogador Jamal Adams, ao estilo de dois anos atrás com Earl Thomas e os Seahawks.

Contam que em 2018 o front office de Seattle apenas desligou o telefone na cara dos Jones. Um tanto grosseiro, não? Ou será que teria sido muita cara de pau a proposta? Não sei.

Na hora eu já escuto os Jets cantando em cada um dos cantos dos seus war rooms virtuais “You don’t want my love … You want satisfaction, oh yeah … You don’t need my love … You gotta find yourself another piece of the action, yeah”. E, digo mais, devem estar ouvindo a versão acústica de You´re Crazy do album GN’R Lies e não a visceral do Appetite for Destruction. Mas, e se eles de repente trocarem a versão, apertarem no botão do f… e aceitarem a proposta vinda de Dallas? Agradeçam ao Deus Slash e seu amigo Axl Rose.

 

A ACUMULADORA

Que tal descer e acumular picks, caso os principais targets já tenham saído e só existam jogadores disponíveis com nota de segunda rodada na big board de Dallas? Será que não valeria a pena uma troca, descendo posições e acumulando escolhas em outras rodadas? Se envolvesse picks tardias da primeira rodada e, também, da segunda rodada certamente o front office dos Cowboys ficaria tentado. É uma situação interessante se analisarmos o roster de Dallas, que precisa de vários atletas a nível de titularidade mas, ao mesmo tempo, possui bastante talento no time titular e nas principais posições. Assim, o draft poderia suprir as carências do elenco com jogadores que, embora não prospectos estelares, seriam tranquilamente titulares da equipe.

O problema dessa estratégia é encontrar alguém que queira fazer a troca. É aí que entram os The Beatles, com sua magistral With a Little Help From My Friends do icônico Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. Tem que achar um parceiro para o negócio. Se os Cowboys se apresentarem para o negócio, o preço cairá. E quem poderia estar interessado? Certamente equipes que estão se remontando. Carolina Panthers? Cincinnati Bengals? Ou entre aqueles que têm muitas escolhas, tipo o Miami Dolphins, Los Angeles Raiders, Jacksonville Jaguars ou Minnesota Vikings.

O NEGÓCIO DE ALUGUEL

O baixo do Roger Waters em Money é um absurdo. O restante da música mais ainda. Pink Floyd é uma das minhas bandas favoritas. Têm pessoas que quando falam de música, ao tentar fazer aquelas intermináveis e altamente discutíveis listas das maiores bandas de todos os tempos, afirmam categoricamente: há o Pink Floyd e depois as demais bandas. Eu não tenho os londrinos/’cambrigenses’ como minha banda número um, mas concordo com a afirmação antes exposta.

O cerne dessa estratégia é tentar alguma troca ainda antes do draft por um jogador de “aluguel”, ao estilo Quinn em 2019. A tática é idêntica à do ano passado, consistente em realizar uma troca com alguma outra franquia, adquirindo um atleta em ano final de contrato e que elimine uma necessidade clara para o draft. O fato de estar no ano final do acordo com a equipe de origem diz respeito apenas ao seu preço de mercado, o money a ser gasto, que pode cair consideravelmente. Lembrem-se que na temporada passada Dallas obteve grande sucesso ao trocar uma escolha de sexta rodada do draft por Robert Quinn, tanto no aspecto de valor gasto quanto de retorno esportivo. Embora o defensive end estivesse em baixa na liga, ele era um jogador afirmado, tanto que o seu salário chegava a quase US$10 milhões. Porém, estava na última temporada de contrato válido com o Miami Dolphins, circunstância que fez cair muito a pedida.

Eu tenho quase certeza que o front office está procurando alguma alternativa desse tipo, e há alguns nomes já comentados na mídia, tais como Carl Lawson, defensive end do Cincinnati Bengals, e David Njoku, tight end do Cleveland Browns. Ambos jogam em franquias em reformulação, com escolhas altas no draft, e possivelmente uma proposta envolvendo o envio de escolhas de terceiro dia do draft seria suficiente para assumir esse verdadeiro aluguel de um ano dos jogadores. Ano passado deu deu bastante certo. Nos tiraria uma preocupação para o draft. Pelo preço certo, que tal tentar novamente?

 

O RETORNO

Há um jogador icônico de Dallas implorando seu retorno para casa. Esse atleta se chama Dez Bryant. O ex-camisa 88 dos Cowboys é um ídolo, não há dúvidas. E que tal trazê-lo de volta? Há inúmeros prós e contras, sendo que pesa contra ele o fato de estar fora da liga há duas temporadas, inclusive com uma lesão significativa no tendão de aquiles quando foi contratado pelo New Orleans Saints. Nenhuma outra franquia aparentemente fez alguma proposta que o agradasse (será que alguém efetivamente o contatou?). Mas, nessa offseason, ele foi visto treinando com Dak Prescott. Será que Dez Bryant teria uma temporada tão decepcionante quanto teve Jason Witten em 2019? Será que ele impediria o desenvolvimento de algum jogador jovem de Dallas com a sua chegada? Será que ele aceitaria um papel bastante reduzido, em situações muito específicas de campo? Sinceramente, em contrato de baixo valor e devidamente acertadas as arestas, eu queria ver esse sangue quente agitando o coreto dos Cowboys, na sideline e em campo. Acho, inclusive, que ele merece isso.

E o quanto isso impactaria no draft? Bem, possivelmente a necessidade por um wide receiver nas duas primeiras rodadas diminuiria, especialmente se considerarmos algum atleta para situações de redzone.  Claro que se um super top wide receiver estivesse a disposição na dezessete da primeira rodada a família Jones, Mike McCarthy, Will McClay e toda a nação Cowboys suaria frio para decidir. Porém, temos que colocar na mesa que dificilmente isso ocorrerá e que o retorno de Bryant nos deixaria confortável até quase o terceiro dia do draft para buscar um recebedor com as suas características. Além disso, lá no fundo, surge uma voz única e fantasmagórica dizendo “It hurts so bad, it’s been so long … Mama, I’m coming home“.

A PACIENTE

Essa estratégia precisa de muita, mas muita calma. Quase passível de sedação. Ninguém pode sair um instante dela, mesmo que o dedo esteja coçando para eventualmente puxar o gatilho, realizando alguma troca no meio do draft ou qualquer ação que comprometa o resultado final. É algo completamente matemático e cirúrgico. A estratégia tem que ser executada com uma frieza e cálculo exemplares, desde o momento exato em que as propostas devem ser feitas à forma de serem expostas. O grande problema é o que canta Joey Ramone em I Wanna Be Sedated dos Ramones, “I can’t control my fingers, I can’t control my brain“.

A estratégia consiste em fazer as escolhas do draft de forma bastante conservadora, usando todas as picks no momento certo, com o melhor jogador disponível naquele instante, levando em consideração as posições premium e depois as demais.  Assim que terminar o processo do draft, iniciar uma busca por atletas ainda disponíveis na free agency, apenas para completar o grupo. Por fim, em momento adequado, nem um segundo antes e nem depois, quando o início da temporada puder ser visto no horizonte próximo e o New York Jets ainda não tiver conseguido a extensão contratual com Jamal Adams, e, então, num momento de fraqueza alheia, oferecer à equipe novaiorquina uma troca envolvendo a nossa primeira escolha de 2021 pelo excelente safety. Se tudo correr bem, é uma excelente estratégia. Mas ela depende de muita paciência, de esperar o tempo certo das coisas, de encontrar os jogadores certos e por valores condizentes entre aqueles ainda disponíveis, convencendo-os do plano em ação de Dallas. E, por derradeiro, de descobrir o ponto ou o momento fraco a ser explorado para garantir o aceite da troca que já foi negada em 2019.

E aí, chegaram até aqui? Gostaram das opções? Curtiram dos sons? Qual a melhor? Existem outras? Beleza, comenta aí e, não tenho dúvidas, qualquer que seja a estratégia adotada, se ela der certo, ao final a trilha sonora será We´re the Champions do Queen.

Saudações e Go Cowboys!


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Diego Barros

Torcedor do Dallas escondido no velho oeste do Rio Grande do Sul. Veterano na torcida desde a década de 90, louco para recuperar o Lombardi.

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